O rio


Tinha que atravessar o rio, pois prometera levar amoras para sua mãe fazer um bolo. A água estava fria e a correnteza, grande.
"Porque não sou mais forte?"
Saiu do rio, sacudiu-se e rumou para as amoreiras. Pegou o lenço que trazia no bolso e começou a colher sua promessa, com os frutos fazendo rubra sujeira.
Feita sua tarefa, acocorou-se sob as árvores.
Aconchegante sombra, nem ocultava nem deixava o sol castigar sua pele. Olhou para o terreno que lhe fora proibido - sonhava que havia uma belíssima princesa de cabelos cacheados naquele terreno ali, mas lhe era proibido ir além das amoreiras.
"Oras, existirão outras moças belíssimas de cabelos cacheados em alguma outra parte do planeta onde me é permitido ir."
Voltou para atravessar o rio e notou que estava muito, muito mais fria do que antes. Olhou para o rio e a correnteza era muito, muito maior. E foi mergulhando, os pés não tocando mais o fundo lodoso do rio.

(Sugiro ouvir a música "Cold Water" de Damien Rice)

Um comentário:

Calebe disse...

A música deixa o conto bem mais -- não sei se a palavra é "triste". Provavelmente estou pensando em algum lugar entre "distante" e "silencioso". Um conto de saudades nunca mencionadas, talvez.